segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Subida do mar pode custar milhões à economia


A subida do nível do mar pode ser mais rápida do que o previsto e custará dezenas de milhões de euros por ano se nada for feito. Alerta para Portugal. A Agência Oceânica norte-americana considera possível um aumento entre 2 a 2,7 metros do nível do mar até 2100, em casos extremos de emissões de gases com efeitos de estufa. No entanto, estudos da paleoclimatologia (estudo das condições e alterações climatéricas de períodos geológicos antigos) apontam para uma subida de 6 a 9 metros. Portugal é um país costeiro e actividades ligadas ao turismo ou imobiliário seriam as primeiras a sofrer as consequências. Os custos para a economia podem chegar a dezenas de milhões de euros por ano. 

Conhecimento do futuro com base no passado 

“Os estudos mais recentes descobriram que a Gronelândia e o Oeste da Antárctida são mais instáveis do que se pensava, isto é, parece agora mais provável que derretam até 2100. Há 125 mil anos, houve um período quente (Eemiano). Desde há 10 mil anos, temos tido temperaturas mais baixas. No Eemiano a temperatura média global não foi muito superior à actual, que se situa nos 16.º C, tendo subido 1.º C durante o período pré-industrial (até 1750)”, explica Filipe Duarte Santos, professor e investigador da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa “O acordo de Paris selou, em 2015 (entrou em vigor em 2016), o compromisso de não subirmos a temperatura média global mais de 2.º C. Temos 1.º C de folga. No Eemiano, a temperatura era muito próxima da actual, mas o nível do mar estava 6 metros acima do valor actual. O compromisso de não aumentar mais de 2.º C foi feito quando se pensava que o nível do mar não aumentaria mais do que os tais 2 a 2,7 metros até 2100. Mas o Eemiano diz-nos que pode aumentar muito mais”, acrescenta Duarte Santos. Essa realidade é bem visível na imagem abaixo apresentada. 


Riscos e custos em Portugal “Sendo Portugal um país costeiro, situado numa península e constituído por mais dois arquipélagos, está sujeito aos riscos inerentes à subida do nível médio da água do mar. Embora algumas actividades marítimas possam vir a ser atingidas, o imobiliário afecto a diversos usos, como habitação, estacionamento, hotelaria, cultura, transportes, distribuição… localizado em cotas negativas, muito em cima da costa, será o que estará mais exposto”, afirma Miguel Marques, partner da PwC, consultora que elabora anualmente o LEME – Barómetro da Economia do Mar. A fileira do mar, que tem crescido de forma significativa em Portugal, conforme o comprovam os dados mais recentes publicados pelo INE e PwC, não ignora a ameaça. “No âmbito da última edição do LEME – Barómetro PwC da Economia do Mar, efectuámos um inquérito a 50 líderes da economia do mar, em Portugal, sobre risco e impacto da subida do nível médio da água do mar. 51% considerou que o risco é elevado, 27% considera o risco razoável e 22% considera o risco baixo. No que respeita ao impacto, 61% considera o possível impacto elevado, 28% considera o possível impacto de médio e 11% considera o possível impacto de baixo”, revela Miguel Marques. 

A única forma de contabilizar os eventuais prejuízos para a economia resultantes de uma subida acentuada do nível do mar é olhar para os custos de contenção da linha costeira portuguesa. O Relatório do Grupo de Trabalho do Litoral, apresentado em Dezembro de 2014, dá uma ideia muito aproximada do impacto económico. Nas duas últimas décadas, Portugal teve um investimento médio anual de 8,3 milhões de euros. Segundo Filipe Duarte Santos, o custo de não intervenção seria multiplicado por seis, isto é, 50 milhões de euros anuais. O projeto ClimateCost avaliou em 11 mil milhões de euros o valor médio anual dos estragos provocados pela erosão e inundação nas zonas costeiras da União Europeia no período de 2040-2070 num cenário de não adaptação conjugado com um cenário intermédio de emissões de gases com efeito de estufa. O mesmo estudo projecta para os custos médios anuais do investimento em adaptação no mesmo intervalo de tempo valores compreendidos entre 1 e 1,5 milhares de milhões de euros (a preços de 2005). Com essa adaptação os custos dos prejuízos provocados pelos impactos seriam reduzidos, relativamente aos custos da não adaptação, por um factor de 6. “O agravamento do nível do mar é certo. Mas há fenómenos muito locais que podem diferenciar o impacto. As actividades económicas têm tempo para se adaptarem e os desportos radicais até podem ganhar com isso. Há, de facto, areais que podem desaparecer. Essa realidade já existe. A Norte de Espanha ou a Sul de Viana do Castelo há calhau rolado e não areal. Esmoriz é um bom exemplo. A verdade é que muitas actividades balneares não precisam de areal. A Sul de Barcelona, não há areal, mas os cidadãos também não querem a sua reposição”, explica Veloso Gomes, professor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) e especialista nas áreas de Hidráulica, Recursos Hídricos e Ambiente.

“Espinho é bom exemplo de como é possível conter o avanço do mar. A sua linha de costa é igual a 1911”, acrescenta Veloso Gomes. No entanto, este feito não foi isento de custos. Segundo o Grupo de Trabalho do Litoral, entre 1995 e 1998, as obras naquela cidade chegaram aos 10,2 milhões de euros e entre 2008 e 2011 a 7,9 milhões de euros, o que significa a necessidade de reinvestimentos em defesa costeira de cerca de 80% relativamente aos efectuados na década anterior. Um fenómeno global Embora seja um fenómeno lento, o problema é que o fenómeno é cumulativo. Conforme recorda Miguel Marques, o problema agrava-se quando se juntam outros factores, como por exemplo a acidificação dos oceanos, os episódios climáticos extremos e a concentração urbana junto ao mar e aos planos de água. 

Por exemplo, o Kiribati é um país insular, com uma zona económica exclusiva de cerca de 3,5 milhões de Km2 (12.ª maior Zona Económica Exclusiva do mundo), cujo ponto mais elevado mede cerca de 2 metros. “Neste país, o seu presidente procura incessantemente, tomar medidas de protecção em relação a cheias e ao mesmo tempo procura, num país vizinho (Ilhas Fiji), adquirir uma área capaz de receber toda a população do seu país (mais de 100 mil habitantes) em caso de necessidade de evacuação total. Tendo em conta que já algumas aldeias desapareceram, que os cientistas prevêem que, a manter-se o ritmo de degelo nos pólos e os efeitos da erosão costeira durante este século (acelerados pela acidificação dos oceanos que retarda a formação de novos corais), a maior parte do país afundará”, refere Miguel Marques. 

Na Europa, o caso mais falado é o da Holanda, que através de um sistema de diques e de barreiras ganhou território em cotas abaixo do nível médio do mar. Sempre que o nível médio do mar sobe, o país estuda formas de mitigar o problema através do reforço do sistema de diques e de barreiras de protecção. A população mundial está a crescer e continua a deslocar-se de zonas rurais para zonas urbanas, criando mega cidades. “Muitas destas megacidades estão localizadas em zonas costeiras (Xangai, Istambul, Nova Iorque), com índices de construção imobiliária elevados””, alerta Miguel Marques, um dos responsáveis pelo Barómetro da Economia do Mar. 

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